Dois minutos. Esse é o tempo necessário para acessar um manifesto online, ler os argumentos e se tornar um apoiador. No último ano, mais de 3 milhões de brasileiros agiram dessa forma, e as duas maiores organizações mundiais de abaixo-assinados abriram filiais no País. A novidade piscou no radar da “classe política”, que ainda tenta aprender como lidar com esse mecanismo de pressão.
Os números são superlativos e devem acompanhar o avanço da banda larga no País – hoje disponível para 30% dos brasileiros. Dois milhões assinaram uma petição para que a Câmara dos Deputados votasse o projeto da Lei da Ficha Limpa.
Um milhão e 600 mil colocaram seu nome contra a eleição de Renan Calheiros (PMDB-AL) para presidir o Senado. Recém-eleito para presidir a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, o pastor Marco Feliciano (PSC-SC) já é alvo de um manifesto pela sua destituição com 280 mil apoiadores.
O fenômeno virtual desperta desconfiança de setores da sociedade que temem que os abaixo-assinados online consolidem o “ativismo de sofá” e enfraqueçam formas tradicionais de protesto, como intervenções urbanas ou marchas em vias públicas.
Mas, para pesquisadores, a tendência é irreversível: a internet consolidou um novo espaço público para debate e formação de opiniões e, assim como provocou mudanças na cultura e na economia, também provocará transformações na política.
Para Pedro Abramovay, diretor de campanhas da Avaaz, ONG internacional de ativismo online que reúne 20 milhões de apoiadores, sendo 3 milhões brasileiros, o modelo tradicional de democracia representativa, com um voto a cada quatro anos, é insuficiente para dar conta de uma realidade na qual os cidadãos podem se conectar rapidamente em torno de um objetivo comum. “Tenho certeza de que a política nunca mais vai ser a mesma”, afirma.
Abramovay cita como exemplo o ato de compartilhar uma petição no Facebook, para ele um comportamento “profundamente político” na medida em que a pessoa assume uma posição diante de seus amigos e abre espaço para contra-argumentos. “As pessoas passam tanto tempo na internet, ela é uma parte tão importante para nossas vidas, que considero despolitizador dizer que a política feita ali é menos importante”, diz.
Atento ao fenômeno, o parlamento alemão desenvolveu sua própria plataforma oficial para que a população organize abaixo-assinados. Se a petição alcançar 50 mil apoiadores, os deputados são obrigados a discutir o tema. A Casa Branca, nos Estados Unidos, tem sistema parecido, o “We The People”.
Lobby
A Avaaz é financiada por doações voluntárias e se define como uma ONG de defesa do interesse público, e não uma mera plataforma de petições. A entidade deleta abaixo-assinados que ferem seus princípios e aposta suas fichas em outros. Sua força vem da união dos manifestos com uma estrutura azeitada para fazer lobby.
“A gente combina esse instrumento de petição online com uma equipe que tem acesso a parlamentares, que sabe fazer isso”, diz Abramovay, ele mesmo um conhecedor dos meandros de Brasília: foi ex-secretário nacional de Justiça do governo Lula.
Na campanha contra Calheiros, a Avaaz visitou gabinetes de senadores e contratou uma pesquisa do Ibope, que apontou que 74% dos brasileiros seriam favoráveis à renúncia do alagoano.
Os pastores Silas Malafaia e Feliciano já avisaram que vão processar a ONG após terem petições a seu favor bloqueadas pela entidade. Contrariado, Feliciano organizou um manifesto em seu próprio site e reuniu 150 mil apoiadores. “Isso mostra que nossa atuação tem tido um efeito político grande”, diz Abramovay.
Fonte: O Estado de S. Paulo/EcoDebate
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